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29.7.12

FMM Sines 2012 – Dia 5: Quinta, 26 de Julho

Tango africano!

Staff Benda Bilili, por Mário Pires

Dubioza Kolektiv

É incrível perceber que ainda há, em dois mil e doze, tanto público que gosta de bandas que não têm qualquer mensagem ou  interesse musical , que se formaram para ser incluídas na prateleira "World Music" e que apenas têm pretensões "festivaleiras". A guerra e as privações podem desculpar muita coisa (não esqueçamos que a banda é Bósnia), mas a velha história da salvação através da música não desculpa tudo. Não há toque de Midas que valha a esta banda. Pobre. Muito pobre.

Astillero

Uma das banda de Buenos Aires mais quentes do novo tango novo trouxe consigo uma energia incrível, que exponenciou a tremenda emotividade associada a este género musical. A ousadia de criação de uma visão própria de tango é uma imagem de marca de Astillero. Os sons recriados são os da Buenos Aires actual. As letras frescas da voz áspera, que ao mesmo tempo puxa à lágrima, são parte fundamental de um conceito que vai muito para além da música. Um dos toques que marca a diferença é dado pelas imagens de vídeo, tanto poéticas como políticas, que são projectadas ao vivo e que ajudam a reforçar o dilúvio sonoro. O que vimos foi um tango mais ousado e experimental do que a maioria das orquestras de tango. Dado curioso : o violonista dos Astillero é fisicamente muito parecido com o violinista de Kronos Quartet. Tendo em conta a similitude do som, a coincidência ganha uma dimensão ainda maior. Os Astillero estiveram em Sines e fizeram-se notar!

Fatoumata Diawara

O Mali, riquíssimo país africano que atravessa uma profunda crise que tem sido ignorada pela comunidade internacional, lançou (mais uma!!!!) estrela no circuito "World Music". Ainda que saibamos que Fatoumata tem perfil de estrela,temos de admitir que o concerto era por nós aguardado com algumas reservas, muito por culpa da decepção que tivemos depois da audição de um dos discos que mais sensação causou no ano passado. A perfomance de Fatomauta, um misto de funk, jazz e, claro está, da música da região de Wassoulou - zona do Mali de onde é originária - foi tão eclética quanto excitante. O concerto ao vivo desmentiu tudo o que o disco nos tinha dito e provou que Fatoumata pode mesmo ter a força de outras grandes cantoras do Mali (não é demasiado dizer que a sua presença em palco se pode comparar à da sua mentora Oumou Sangaré). A tudo isso, juntou-se um intenso brilho visual - suportado pela beleza de Fatoumata e pela excelente escolha das vestes que a cobriam - e a complementariedade da guitarra eléctrica que toca (ao jeito "finger picking"), articulada com a fortíssima secção rítmica e com o baixo.

Staff Benda Bilili

Numa altura em que ainda aguardamos para ouvir o novo álbum de Staff Benda Bilili,relembramos Trés Trés Fort, um dos grandes álbuns de música africana dos últimos anos. Na música do Congo e na editora Crammed há muito mais do que a percussão minimal proeminente dos primeiros volumes da série Congotronics. Há - sobretudo - rumba congolesa, influenciada por grandes mestres dos anos setenta como Franco ou Tabu Ley Rochereau, bem mais próxima da lógica afro-cubana do que de uns Konono Nº1, a que se acrescenta a invenção de um incrível instrumento artesanal formado a partir de uma lata de leite, onde foi anexada uma corda e de onde saem sons genialmente vibrantes. Ao vivo, o concerto foi, tal como em 2010, arrebatador. Podia temer-se que, depois da passagem dos congoleses pelo palco do Castelo em 2010, se esgotassem alguns dos principais trunfos e que o concerto pudesse ser menos interessante. A grande verdade é que foi muito consistente do princípio ao fim e teve muita energia e muita festa em palco. Para quem julga que é o factor pena que provoca a aclamação unânime da crítica deste projecto de Kinshasa, fica a resposta através de um cliché: “Todos diferentes, Todos iguais”. Os Staff Benda Bilili são musicalmente brilhantes e voltaram a prová-lo num dos grandes concerto do festival.

Texto:José Bernardo Monteiro e José Amorim

FMM Sines 2012 - Dia 3: Sábado, 21 de Julho

"Magia banjoístico-guitarrístico-vocal"!

Oumou Sangaré, por Mário Pires


Dead Combo feat  Marc Ribot

As expectativas para o concerto de Dead Combo, em mais um fim de tarde soalheiro de Sines, eram altas. Abertas as portas do castelo, uma autêntica multidão encheu a plateia, dividindo-se entre quem vinha directamente da praia e quem chegava asseadinho, todos juntos para ouvir esta parceria do grupo português com Marc Ribot, registada em disco em “Lisboa Mulata” de 2011. Fruto de uma colaboração à distância, juntaram-se fisicamente pela primeira vez para este concerto, no mínimo intenso. Tó Trips e Pedro Gonçalves começaram sozinhos mas rapidamente tiveram a companhia de um enorme Alexandre Frazão, que não deu descanso ao “apanhador de baquetas” oficial do FMM (foram  várias as vezes que as ditas cujas saíram disparadas pelo ar). O seu trabalho na bateria e percussão, feito de detalhes, faz todo o sentido neste grupo virado ultimamente para as sonoridades africanas. Marc Ribot juntou-se a este trio e tornou ainda mais rica a viagem que os Dead Combo proporcionam a cada audição da sua música. No seu último album exploraram os ritmos e melodias africanos e neste concerto trouxeram tudo isso à tona. O público agradeceu e sorridente saiu do castelo para jantar, orgulhoso destes Dead Combo que continuam em ascensão e que resultaram quase perfeitos neste FMM que estava a arrancar definitivamente para uma noite fortíssima.

Oumou Sangaré & Bela Fleck

Por volta das 22h começou aquele que foi por muitos considerado o melhor concerto do festival. Oumou Sangaré e Bela Fleck, apoiados por uma banda genial em que se destacou o baterista Will Calhoun e o baixista Alioune Wade, deram um concerto vibrante, pleno de africanismo, tal como o público de Sines bem gosta. Dona de uma voz superior, a já consagrada Oumou Sangaré - que se estreou neste festival em 2007, continua em grande forma e surpreendeu pelo seu entrosamento com Bela Fleck. Considerado o melhor banjoísta da actualidade, integrou-se perfeitamente nas melodias da banda de Sangaré, arrancando também alguns solos brilhantes de um instrumento que não estamos habituados a ouvir por estas paragens mas que, curiosamente, é oriundo de África. No final da quase hora e meia imparável de concerto, pediu-se um encore e os músicos regressaram ao palco enchendo definitivamente as medidas. Cada um teve direito ao seu solo de despedida, inclusivé a cantora suporte de Sangaré - que aí decidiu mostrar a todos os presentes o que é a dança africana em todo o seu esplendor. Brilhante!

Marc Ribot y los cubanos postizos

Se nos dissessem que, em Sines e na mesma noite, podíamos ver Marc Ribot tocar duas vezes -  ainda por cima em contextos completamente diferentes -, responderíamos que só podia ser uma brincadeira. Como a realidade ultrapassa (quase) sempre a ficção, tivémos de nos render à evidência do acontecimento. A dupla aparição deu-se num sábado mítico, numa das melhores noites de sempre da história do FMM. Marc Ribot, o homem das colaborações e dos projectos quase infinitos, o guitarrista genial  (“o Ronaldo das guitarras”, nas palavras de Tó Trips), pisou novamente o palco do Castelo, depois de por cá ter andado com outro dos seus outros projectos: The Young Philadelphians. Agora com os Cubanos Postizos, sete anos depois, voltou para arrasar! É sufocante ver a maneira como Marc Ribot toca. São tanto os pormenores de magia (é mesmo possível fazer magia com uma guitarra!), que nem há tempo suficiente para os absorver: são os tempos perfeitos das entradas, é a facilidade com que muda de ritmo, a forma como improvisa e volta ao concerto, a técnica com que toca ou as notas que nunca falha. A diáspora Cubana para os Estados Unidos, tão bem transposta para pauta por Ribot e pelos seus músicos (trabalhadores incansáveis, tocadores incríveis com formação de jazz e muitas vivência nova iorquinas), tem por base os estudos que Ribot fez sobre Arsenio Rodriguez “El Ciego Maravilloso”, o maior herói da composição cubana juntamente com Benny Moré - um daqueles seres humanos que merece um biopic épica, tal a vida intricadamente interessante que viveu (deixamos a sugestão para quem o queira fazer...). O que se ouviu no castelo foi uma coisa séria. Foi música da mais fina, curada nos melhores fumeiros “postizos” de Nova Iorque.  É música que não se esquece...

Imperial Tiger Orchestra e Hamelmal Abate

Foi por culpa da Série Ethiopiques, uma das mais míticas colecções de sempre da música africana (que incorpora vários singles e álbuns que a Amha Records, a Kaifa Records e a Philips-Etiópia editaram durante os anos sessenta e setenta na Etiópia e que destaca cantores e músicos como Alemayehu Eshete, Mahmoud Ahmed, Mulatu Astatke ou Tilahun Gessesse), que um grupo de músicos Suíços (!!!) começou a interpretar música Etíope. Para a tocar ao vivo, precisavam de alguém que desse a cara e um cunho de autenticidade à sua música. Foi assim que Hamelmal Abate, que não tem o nome dos grandes músicos dos anos setenta mas que vimos como uma excelente presença em palco, foi chamada para incorporar esse papel. É bizarro ouvir (e ver) uma cultura tão própria ser recriada por quem, à partida, parece estar nos antípodas culturais da fonte de que bebe. Conseguir deixar de lado as marcas culturais definidoras da identidade é uma tarefa difícil. Ser suíço pode efectivamente atrapalhar quando se tenta fazer música Etíope. É um facto.  É também um facto que tocar a seguir ao concerto de Marc Ribot y los Cubanos Postizos é muito ingrato. Apesar de tudo, os Suíços conseguiram dar um bom concerto, melhor sempre que foram recriadas versões de clássicos da colecção Ethiopiques. O groove, por vezes excessivo, ajudou a conquistar o público, mas prejudicou a qualidade musical. Fez-se a mudança de planos necessária para o que viria a fechar a noite: a eletrónica bizarra das 180 batidas por minutos de Shangaan Electro.   José Bernardo Monteiro e José Manuel Amorim

FMM Sines, dia 2 (20 de Julho)

Morninho, morninho!


Al Madar, por Mário Pires

A RU( chega ao FMM só no segundo dia de festival e depara-se com um castelo relativamente despido de público. É certo que a ideia do primeiro fim-de-semana não será ter o recinto a abarrotar de gente, que a ausência do palco gratuito da praia afasta muito público destes primeiros dias e que há a concorrência do Milhões de Festa, mas parece que, nas mesmas condições, a afluência era maior no ano passado.

A marca portuguesa do dia surgiu ao final da tarde (uma regra desta edição do festival), com os Osso Vaidoso, o novo projecto conjunto de Ana Deus e Alexandre Soares dos Três Tristes Tigres (TTT). Apenas com guitarra e voz, explorando o ruído das cordas e a poesia de nomes como Regina Guimarães ou valter hugo mãe, soou a concerto descontextualizado para o espaço e para um final de tarde a exigir outro calor. É tudo muito minimal e exige atenção nos detalhes e na minúcia das palavras, o que torna este som apropriado para um espaço mais pequeno e fechado. Com melhoria nos temas com guitarra acústica (com um outro balanço) e com passagens pelo repertório dos TTT, foi um concerto frio, tanto quanto o gerado pelo vento de final de tarde no litoral alentejano.

O primeiro round do cruzamento oriente-ocidente teve um resultado agradável. Al-Madar é a fusão entre o multi-instrumentista libanês Bassam Saba (desde o alaúde até à flauta transversal) e um conjunto de músicos americanos com referências cosmopolitas muito diversas, desde um jazz mais emotivo e menos técnico até um som mais abrasivo e descomprometido, como o demonstram os Secret Chiefs 3, grupo que integra dois elementos desta orquestra e que deu um concerto bem caricato no FMM 2011. Com um repertório eclético guiado pelo virtuosismo de Saba, baixo e bateria lentos e quentinhos e momentos mais ritmados a cargo do trompete, cumpriu com distinção o papel de concerto de início de noite.

Depois da calma de Al-Madar, coube aos L'Enfance Rouge o esforço de incendiar as hostes com um rock cheio de distorção, contornos noisy e pequenos resquícios étnicos orientais. Pena que não da melhor forma... não ficámos convencidos com o concerto do projecto há 3 anos em Sines ("a suposta fusão aparenta ser nesta performance dos L'Enfance Rouge um profundo acto falhado", dissemos na altura)  e a opinião manteve-se, embora de forma um pouco diferente. Os aspectos étnicos, que praticamente não identificámos em 2009, têm agora uma incidência maior por via da voz do grande músico tunisino Lotfi Bouchnak. As vocalizações são magníficas, herdeiras de um registo oriental recheado de espiritualidade, mas ampliam ainda mais o divórcio com a componente instrumental. Apetece por vezes retirar electricidade ao som de fundo ou desligar mesmo alguns instrumentos. Assim, soa a desperdício.

Seguiu-se o projecto Frigg e, com ele, uma fusão entre linguagens irlandesas, bluegrass e uma folk nórdica pouco detectável. Os músicos são simpáticos e fazem um esforço consistente para empolgar a plateia, mas, numa altura da noite já avançada, a combinação acelerada dos vários violinos e dos restantes instrumentos de cordas acaba por se tornar algo monocórdica e esmorecer algum público menos devoto a este registo. Não há nada de errado nos músicos finlandeses e ouve-se com agrado a sua música, mas falta aqui um pormenor, uma desconstrução ou um instrumento capaz de criar abalos rítmicos: seja alguma percussão, um metal ou uma gaita, que era suposto ter sido interpretada em palco, mas que não chegou a comparecer e a dar o impulso sónico que tanto se desejava.

Com uma tuba a fazer as vezes de um baixo, num ritmo quase sempre infernal alimentado por dois trompetes e um trombone seriamente afiados, Los Mezcaleros de La Sierra e Clorofila (Jorge Verdin, natural de Tijuana) trouxeram ao FMM uma mistura contagiante de música electrónica com os ritmos e melodias tradicionais do Norte do México, numa fusão recente apelidada de "Nortec". Apoiados por uma projecção de imagens e frases de contestação - por exemplo ao narcotráfico - estes mexicanos puseram o castelo de Sines a dançar freneticamente. Estava já tudo embalado pelos ritmos de Frigg (seja em que sentido for), mas foi com esta mistura que se inventaram novas danças para novos sons. Uma noite claramente em crescendo, num FMM ainda morno, mas com expectativas de aquecer bastante nos próximos dias.

Texto: João Torgal e José Amorim

23.7.12

Super Mama Djombo no B’leza

Super Mama Djombo, retirado de http://muzikifan.com

São poucas as bandas que se podem orgulhar de ter ajudado a construir um país. Os Super Mama Djombo trilharam caminhos na construção da identidade cultural da Guiné-Bissau, sem nunca terem vergado à comodidade que a pós-independência lhes podia ter oferecido como banda oficial do regime: o espírito crítico nunca abandonou as tendências da música que fazem - sobretudo depois da morte de Amílcar Cabral, que marcou o início do caos político na Guiné. Na noite quente de 19 de Julho, no B’Leza, ouviram-se os principais hinos dessa(s) luta(s).
O início da primeira parte do concerto foi morno, com uma balada introdutória que ajudou as pessoas a acomodarem-se. À medida que o tempo foi passando, soltaram-se os músicos e rejubilou o público – a energia da música foi construída à base do diálogo constante com o público. O B’leza oferece condições sonoras excepcionais, espaço suficiente para dançar e tem, ao mesmo tempo, um ambiente familiar (as relações de amizade entre os espectadores era evidente): são os velhos conhecidos que ajudaram a construir a mística de um sítio que fazia muita falta a Lisboa e que pode ajudar a que a cidade finalmente se afirme, a nível mundial, como mestiça. As quatro guitarras eram constantemente espicaçadas ao jeito soukous. O poderoso baixo, o saxofone, as congas, a bateria e o sintetizador foram-se fundindo naturalmente até formarem uma parafernália sonora à qual se juntaram dois jovens vocalistas, prova viva de que a banda é constituída por músicos de várias gerações. O Parabéns a você cantando a uma menina do público confirmou as desconfianças iniciais e mostrou-nos que estávamos mesmo em família. Os momentos altos da noite haveriam de se dividir pelas duas partes do concerto (que foi muito longo e teve intervalo para descanso): “Vicente da Silva” e “Dissan Na m’Bera”, que contou a incrível voz da maior estrela internacional da música Guineense - juntamente com Manecas Costa - Eneida Marta.
Ao vivo, a banda que ”queria mostrar ao mundo que o som mais alto que se ouve na Guiné é o da música e não dos tiros de metralhadoras”, mostrou que o projecto inicial está entregue em boas mãos e que os músicos mais novos são fieis depositários do brutal legado que carregam. O presente continua, como o passado recente em que alguns líderes decidiram que a identidade cultural dos países da África Ocidental a que presidiam passava pela formação de bandas que modernizariam repertórios da música tradicional, a fazer-nos ver que não é preciso sair do mundo lusófono para ouvir a melhor música africana. Em que é que os Super Mama Djombo ficam a dever à Rail Band ou a outros colossos da música africana do passado recente? Nada! Absolutamente nada! E a lusofonia aqui tão perto…

17.7.12

Al Madar na Galeria Zé dos Bois, Lisboa

Antes de passar por Sines, os Al Madar vão à galeria Zé dos Bois, no dia 18 de Julho às 22h. Um concerto a não perder!

“Al-Madar é a circunferência que une a música árabe à vivência cultural nova-iorquina. Um projeto da New York Arabic Orchestra, liderado por Bassam Saba.Mesmo depois do 11 de Setembro, a New York Arabic Orchestra, uma orquestra árabe em Nova Iorque, não é um oximoro, é uma alegoria da sanidade multicultural que é a força desta grande metrópole. A orquestra é dirigida pelo libanês Bassam Saba, multi-instrumentista virtuoso (no oud, no nay, no saz, na flauta ocidental e no violino) e um dos mais respeitados professores das músicas árabes. Na ZDB, tê-lo-emos com o ensemble Al-Madar (“circunferência” em árabe”), formado no seio da orquestra. Acompanham-no quatro músicos: dois deles, April Centrone (bateria e percussões) e Timba Harris (violino e trompete), estiveram no Aquário em 2011 com os Secret Chiefs 3 e Master Musicians of Bukkake, e os outros dois são Gyan Riley (guitarras) e Brian Holtz (baixo elétrico). Trazem-nos música árabe fundada em 3 mil anos de tradição mas moldada pela experiência rítmica nova-iorquina (funk, soul, rock, afro-latinidade). No plano de viagem há um mapa – o disco “Wonderful Land” (2010), de Saba – mas espaço à aventura, através da arte árabe do improviso, o “taqsim”, e da liberdade de músicos que falam todas as línguas.” FMM Sines

Entrada: 8 € | Bilhetes em venda antecipada nas lojas de discos Matéria Prima e Flur e na bilheteira da ZDB de quarta a sexta das 18h às 23h, sábados das 15h às 23h.

15.7.12

14.07.2012


Entre novidades e clássicos, assim se fez a última emissão do Artesanato Sonoro da Grelha Regular da RUC...



1 - Bola - ITAL´s Bola Megamix - Bola Remixes (ATFA003)
2 - Tito Puente - Tito on Timbales - Puente in Percussion
3 - Juaneco Y Su Combo - Ya Se Ha Muerto Mi Abuelo - Ya Se Ha Muerto Mi Abuelo
4 - Los Miticos Del Ritmo - La Libanesa - Los Miticos del Ritmo




5 - Curramberos De Gamero - Destápame La Botella - Jende Ri Palenge
6 - Son Palenque - Tungalala (El Sapo) - Palenque Palenque: Champeta Criolla & Afro Roots in Colombia 1975-91
7 -  Tidiane Kone & Orchestre Poly Rythmo - Djanfa Magni - African Scream Contest : Raw & Psychedelic Afro Sounds from Bénin & Togo 70s
8 - The Funkees - Breakthrough - The World Ends: Afro Rock & Psychedelia In 1970s Nigeria
9 - Cacique 97 - Come from Nigeria - Cacique 97
10 - Mamukueno - Rei do Palhetinho - Angola Soundtrack – The Unique Sound of Luanda 1968-1976 




11 - Batida - Tirei o Chapéu feat. Ikonoklasta - Batida
12 - Throes + The Shine - Batida - Rockuduro


Podcast

4.7.12

IX Edição do festival MED Loulé : Este festival (também) é para velhos…


Loulé encheu a casa durante a nona edição do MED. A beleza da cidade e do recinto onde se realiza o festival merece, por si só, que a ele nos desloquemos. Se se acrescentar a isso bastante variedade musical, um grande número de palcos e diversidade de oferta (não é apenas de música que trata o festival), estamos perante um produto bem pensado e concretizado. Infelizmente, por culpa da crise, a janela espaço-tempo foi bem mais curta : apenas dois dias. Há que louvar a inteligência da organização que decidiu cortar na duração, mas não na qualidade...

1º dia - 29 de Junho - música ousada.

Que relação possível existe entre bandas como os PAUS e Throes + The Shine e as “músicas do mundo”? A resposta é simples: a percussão explosiva, que atravessa a música africana e a que foi levada para outras partes do mundo pelos escravos (sobretudo as tribos Yoruba) que dali saíram e que é também comum às duas bandas portuguesas. Esperemos que a força das batidas contagiantes de PAUS (21:45, Palco Cerca) e, mais tarde (23:30, Palco Castelo), do “Rockuduro” dos Throes + The Shine tenha apenas sido um aperitivo para o público jovem que tão ferozmente acorreu aos dois palcos. Seria a prova que o Festival MED teria aberto horizontes musicais …

Cheikh Lô (22:45, Palco da Matriz) regressou a Portugal para um concerto em tudo parecido com o que deu na edição do ano passado do FMM de Sines. Quando dava a entender que o concerto ia seguir uma faceta mais animada e festiva, aparentemente mais adequada à música que habitualmente toca, seguiam-se longas quebras rítmicas! Quase parecia propositado para adormecer as crianças que por ali andavam ao colo dos pais. A força da mistura das referências musicais que fazem parte da sua música parece anular-se ao vivo, talvez porque se espere sempre por algo que não chega. Por mais que tente, ainda não consegui perceber qual é a noção de espectáculo do senegalês…

A Curva da Cintura, projecto musical saído da cabeça de Arnaldo Antunes (ex-tribalistas) e Edgar Scandurra (ex-Ira!), faria a sua estreia mundial no palco da Cerca do MED, às 00:00. Toumani Diabaté, uns dos maiores músicos africanos vivos, que tanto fez pela kora, aceitou (não sei em que condições…) participar num projecto que tem tanto de inesperado como de pouco trabalhado. A genialidade do mestre maliano atenua um pouco a ideia que transparece em disco e que se confirma ao vivo: não há uma linguagem base minimamente comum que permita que a fusão possa fluir. Os músicos envolvidos no projecto têm duas hipóteses: ou criam essa linguagem (o que ainda não aconteceu, talvez porque o projecto tenha pouco tempo de vida), ou partem para a escolha de novas bases musicais que lhes permita comunicar de forma mais fluida. Em palco, houve duelos constantes entre a faceta rock de pai e filho Scandurra (pai na guitarra modelada, filho no baixo) e de pai e filho Diabaté (os dois na kora, sendo que Toumani interpreta um repertório mais tradicional e Sidiki - herdou o nome do avô-, um repertório mais moderno). A voz de Arnalado Antunes - grave, límpida, com grande alcance - nada acrescenta à base musical, independentemente do momento: quer esteja a tender mais para o lado brasileiro ou mais para o africano. A percussão da poderosa baterista lá ia equilibrando as tendências. Era ela a única capaz de jogar dos dois lados do campo: ora em oscilações rock, ora em acalmias de base africana. Este bolo musical ainda não está pronto para ser deglutido … o quilo ainda não é quimo. Alguma vez será? Só o tempo poderá dizer…


Boubacar Traoré, retirado de calabash.typepad.com

2º dia - 30 de Junho - música sólida.

A noite iniciou-se com o experimentalismo folk da música de Norberto Lobo (21:30, Palco do Castelo). O músico português, que teve a aceitação global dos críticos portugueses de A a Z, não sabe fazer nada mal. Enquanto Norberto tocava, subia a palco “A Caruma” (21:45, Palco Cerca), (mais) uma daquelas bandas portuguesas formada para ser especificamente colocada na prateleira “world music”. Apesar de competentes no que fazem (sobretudo ao vivo), a amálgama final soa a uma falsidade pop-étnico-qualquer coisa. A escolha de You can’t Win Charlie Brown (Palco Castelo, 23:30) para um festival de matriz “Músicas do Mundo” é dúbia. Mas podemos sempre pensar que é a bem da variedade…

Para os amantes do reggae, há poucas formas melhores de celebrar os cinquenta anos de independência da Jamaica do que juntar grandes músicos da pequena ilha das caraíbas e pô-los a navegar, pelo mundo, ao sabor do vento da filosofia Rastafari: Ernest Ranglin – genial guitarrista -, Sly e Robbie – lendários músicos e produtores/duo dinâmico do baixo e bateria - e Tyrone Downie - virtuoso pianista e teclista de tantas bandas importantes do género- foram os primeiros (mas não os únicos) a provar que a experiência pode ser uma arma mais poderosa do que dez toneladas de sangue na guelra. Será que foi Jah (Deus), que desceu dos céus e ofereceu a calma, segurança e tranquilidade rítmica ao concerto? Os mais espirituais dirão que é possível que sim… os mais terrenos, que a experiência e avançada idade dos músicos fez a diferença. Afinal, são os homens que fazem a música.

Foi muito engraçado perceber que dois concertos tão diferentes: o de Jamaican Legends e o de Boubacar Traoré, podem ter pontes comuns. A mais óbvia e que aqui interessa construir é a da experiência. Foi um grande prazer poder ouvir - noutras ocasiões tínhamos falhado os concertos do músico que é considerado, erradamente, como o maior bluesman vivo doMali (é muito mais do que isso!) - Boubacar Traoré, quer pelo peso histórico (Boubacar foi um importante escritor de canções que, depois de um período de reconhecimento na luta pela independência do Mali caiu no esquecimento e voltou à ribalta nos anos noventa), quer pela qualidade da música, que vai muito para além do blues: é impossível ouvi-lo e não beber goladas da água da vida da música da África Ocidental. O concerto de Boubacar foi o momento mais alto de todo o festival: pela coerência e qualidade da música, pela atmosfesta de intimidade (é mesmo possível fazer uma festa em intimidade, num palco…) e pelas constantes travessias entre o delta do Missisipi e o delta do Níger. Foram os arranjos que asseguraram a estabilidade das viagens! Vida longa ao senhor da harmónica, que levou o barco em segurança para os Estados Unidos e ao jovem do tambor que o devolveu, tranquilamente, ao Mali.

Parabéns!

José Bernardo Monteiro

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