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27.10.09

Seun Kuti, CCB, 29 de Agosto

Embora com muito atraso, aqui fica a crónica do concerto de Seun Kuti.



Seun Kuti, CCB - 29 de Agosto


Seun Kuti é filho do lendário Fela Kuti, nome grande da música africana e do afrobeat, uma espécie de fusão entre o funk, o jazz mais irreverente e o poder dos ritmos africanos, resultando em algo absolutamente explosivo, contagiante e extraordinariamente dançável. Seun pode já não ser tão visionário como o pai que, da Nigéria para o Mundo, foi o percursor do género que, em plenos anos 70, revolucionou definitivamente a concepção da música africana, incrementando-a com um groove de natureza mais urbana e com uma uma forte produção que a afastou da sua vertente tradicional mais pura e lo-fi. No entanto, herdou do pai o estatuto de entretainer (nunca vi Fela Kuti ao vivo, mas o seu estatuto performativo de estrela é algo unânime) e a capacidade de fazer música extraordinariamente rica, poderosa e que ganha muito corpo na transposição para o formato concerto.


Foi tudo isto que se pôde observar no concerto ao vivo que Seun Kuti deu no CCB em Agosto, concerto integrado no festival CCB Fora de Si, que, do ponto de vista musical, contou com quatro nomes diferentes da world music. Dado o carácter muito festivo e dançável deste tipo de concertos, foi estranho o facto do concerto ter decorrido num espaço com lugares sentados, limitando um pouco a reacção do espectador e que obrigou muitos a ver o concerto de lado ou na parte de trás do espaço, de forma a poder fazê-lo de pé . Para compensar um pouco este senão, a acústica do espaço mostrou ser óptima, proporcionando um som verdadeiramente irrepreensível, algo bastante complicado, dada a multiplicidade de instrumentos presentes em palco.


A estreia do músico em Portugal tinha ocorrido em 2006 , na 8ª edição do FMM Sines. Na altura, sem originais compostos, o músico baseou o seu espectáculo no repertório do pai e, diz quem viu, incendiou por completo o castelo da vila alentejana. Foi também com uma versão de Fela Kuti que se iniciou o concerto do CCB, no caso uma cover instrumental de "Army Arrangement", estando "apenas" em palco os Egypt 80, big band de apoio de Seun Kuti, onde ainda marcam presença alguns músicos que acompanhavam o seu pai, mas sem o gradioso baterista Tony Allen (embora sem o carisma e a notável noção rítmica deste, o seu substituto mostrou estar à altura dos acontecimentos, como aliás se esperava, dada a habitual valia dos músicos de afrobeat). A partir daí, em termos de temas tocados, tudo terá sido diferente do que se passou em Sines. Isto porque, entretanto, Seun Kuti lançou o seu disco de estreia, o fabuloso Many Things do ano passado, disco em que mostra definitivamente ser muito mais do que o filho de Fela Kuti, mas um músico de corpo e alma, com nome próprio e que interpreta originalmente composições verdadeiramente brilhantes. Ao longo de cerca de hora e meia de concerto o músico atravessou o disco, com a riquza instrumental de temas como "Think Africa" ou "Na Oil" a fazer-se sentir, dado o fortíssimo poder rítmico das percussões, o som explosivo e fundamental dos metais ou a magia dos coros. Pelo meio, houve lugar a discurso de intervenção política, com passagem pela questão do Iraque, pelo cinismo norte-americano, pelas desigualdades sociais e pelos paradoxos da crise económica. Um discurso um pouco disconexo e, por vezes, incompreensível que, ainda assim, acrescentou mensagem ao concerto, antecedendo "Many Things", tema título do disco e mais um momento alto da noite. Já depois do verdadeiro caos e êxtase instalado no palco, com os músicos a correrem de forma desenfreada e em todas as direcções no final da parte principal do concerto, houve direito a um encore, em que "Mosquito Song" transportou grande parte dos espectadores para junto do palco, permitindo que todos sentissem da melhor maneira a profunda vibração dançável do afrobeat e da música de Sean Kuti. No fundo, um verdadeiro ambiente de festa e celebração a fechar da melhor maneira um dos grandes concertos do ano em Portugal.

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